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fique sabendo

conversar com alguém sobre câncer é muito difícil, eu não queria chatear ninguém. mas

deste lado da linha

no meu ombro senta um gênio que lembra que as chances de cura são de 30%. que talvez o tratamento com quimioterapia se estenda indefinidamente. que no meio desse tratamento, lá pelo segundo ano, eu morra. eu quero ficar feliz, eu fico feliz com cada resultado positivo — foram vários até agora. minha mãe fala de “alívio”, que vai dar tudo certo. minha esposa fala do apartamento. onde está o gênio no ombro delas? alguns amigos bem intencionados falam que “já tá acabando, logo acaba”.

é difícil absorver tudo isso enquanto desconfio que as pessoas estão mal informadas ou descartando toda informação negativa. pra consertar isso viro a remetente e a mensageira de todas as más notícias, segurando as pessoas que gostam de mim pelos ombros e chacoalhando, “você por acaso esqueceu que é muito provável que eu morra logo? sim? vamos fazer uma revisão”, me descabelando se isso fosse possível, e jogando no ralo toda esperança que elas alimentaram cuidadosamente com cada passo bem sucedido do tratamento. alguém disse que lembrar de tudo (e escrever) é como segurar a sua própria cabeça contra a chapa de um ferro quente, estou eu segurando a minha e a delas. quero sair. preciso saber que elas estão encarando a minha morte em todas as conversas, todos os planos futuros. e que tomando isso em consideração esses planos ainda se sustentem.

tudo isso caminhando na linha que divide a negação e desespero.

do outro lado da linha

meio de 2018 começou a greve dos caminhoneiros. eu e Tiemi no hospital por dias. a gente na sala de espera pra internação foi vendo desde manhãzinha todos os canais falando sobre. segundo dia idem, terceiro com enfermeiros falando da dificuldade de chegar até lá. no quarto um aviso pra conter a troca de lençóis e roupas o máximo possível — a lavanderia perdendo condições de funcionar. escapamos mancando e ainda deu pra pegar avião. me preocupava com o FIQ, com juliana tocando a mesa sozinha. eu tinha certeza de que ia sair do hospital logo.

não tinha mais certeza de nada quando fiquei sabendo o que era — câncer, metástase. só que era grave a doença e grave o tratamento, sem noção de dimensões. então surgiu a denúncia de que muitas mulheres em Pelotas tiveram exames pré-cancer fraudados. que só quando desenvolviam feridas no colo do útero eram biopsadas e aí o quadro já era de metástase. igual o meu. no meio da revolta contra o imbecil que resolveu economizar em saúde (maldito seja) surgiam na minha timeline uns “essas mulheres estão MORTAS” “é metástase, porra!”. eu nunca acompanhei casos de câncer — na minha família próxima, um tio teve e se curou. eu já imaginava ter só uns quatro meses de vida (tirei a estimativa do datacu, não sei de nada), aquilo veio como confirmação. talvez aquelas pessoas soubessem melhor de como uma coisa dessas se desenvolve, talvez alguém próximo tenha passado por isso, e que fosse de senso comum: metástase é morte confirmada.

acho que nenhuma das pessoas desesperadas naqueles dias tem câncer. acho também que elas se importam com as mulheres numa situação absurda e estavam indignadas com tamanha filhadaputice. de qualquer forma fico pensando nos ateus quando o barco afunda — o barco afunda, os que creem em alguma coisa se agarram a isso e se abraçam e fazem o que tem que fazer, os ateus se descabelam e correm pelo convés gritando “vamos todos morrer! vamos todos morrer!”. isso é uma metáfora antiga, de uma época sem coaches falando que se você acreditar pode vencer o mar e a hipotermia, e sem internet onde você poderia assistir vídeos de sobrevivência e se tornar o chuck norris. não tinha chuck norris, e as pessoas morreram indiscriminadamente, com aquela pequena diferença dos momentos finais.

é provável que eu esteja nos meus momentos finais, essas diferenças parecem muito importantes.

tem muito carola no meu barco. mas é difícil de decidir em quem meter uma remada antes, nesses ou nessa galera da lancha ao lado que não para de dizer “vocês vão todos morrer! vocês vão todos morrer!” pelo megafone. jura?

minha mulher atravessa uma prancha e me abraça. meus amigos bebem e conversam, alinhando o convés.

na linha, com o gênio

tudo é perigoso.
um surto de dengue em Bauru este ano. todo mundo aqui pegou. meus irmãos que vieram visitar. meus pais, a cunhada. meu pai, também em quimio, precisou de plaquetas. não existiam plaquetas pois muita dengue, muita demanda. minha mãe doou. me cerco de velinhas de citronela, aplico e reaplico o repelente. o dr avisou: você nesse estado qualquer coisa espalha, qualquer coisa é grave. não fique doente.

governo bolsonaro, más intenções prometidas sendo cumpridas (lucro, violência e chucrice), completa incompetência em todo resto. afogar a rede pública de saúde, asfixiar pesquisas na área, descontinuar compras, adoecer os saudáveis e abandonar os doentes.

água com agrotóxicos, vó assistindo datena, na tablet um aviso de “conspiração comunista”.

meu tratamento e suas variáveis externas, os dois a 80km/h.

tudo é incerto.
sem neoplasia residual, marcador tumoral normalizado antes até do que a cirurgia. caminha bem

assim como caminhava muito saudável toda a minha vida até o cancer. em algum ponto dessa merda toda podia ser só uma infecção

caminha bem. meu fígado se recupera rápido, meus rins se livram dos resíduos, minha medula vai reconstruir tudo depois das sessões

faltam duas, talvez mais e eu nunca saia daqui

talvez uma só, e em menos de dois meses arrumo minhas coisas, vejo meus amigos, trabalho direito, durmo com ela todo dia

alugamos um apartamento e antes mesmo do contrato vencer tenho que me mudar pra um hospital

ou não, e de três em três, seis em seis meses, ano em ano… tudo limpo, sempre

ninguém garante

sempre. pra sempre

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